Vagner A. Alberto Advogados Associados

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04/04/2012

TJ-SP impede Fazenda de excluir empresas do Simples Nacional

Decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) estão impedindo a Fazenda paulista de excluir empresas do Simples Nacional por meio do cruzamento de valores movimentados com cartão de crédito e receitas declaradas. Os desembargadores têm considerado ilícitas as provas utilizadas para demonstrar suposta omissão de faturamento e sonegação de impostos. Eles entendem que essa manobra configura quebra de sigilo bancário e que o contribuinte não pode ser excluído do regime antes da abertura de uma fiscalização.
Com as informações repassadas pelas operadoras de cartões de crédito e débito, a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo excluiu 114 micro e pequenas empresas no ano passado. Em 2010, foram 52 exclusões. A partir da mesma estratégia, a Receita Federal já retirou 30 empresas do regime neste ano. De acordo com a Fisco paulista, os dados financeiros e a Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) permitem identificar indícios de sonegação e otimizar o trabalho dos fiscais. “O uso de informações eletrônicas nas fiscalizações se intensifica a cada ano”, afirma o órgão por meio de nota.
A medida, porém, tem sido considerada ilegal pelo TJ-SP. Em decisão recente, a Corte determinou o reenquadramento da empresa de autopeças Silvia Teresa Faidiga Martins. O estabelecimento de pequeno porte havia sido excluído do Simples porque as receitas de vendas com cartão de crédito teriam superado o limite de faturamento anual de R$ 2,4 milhões – fixado, na época, para as pequenas empresas aproveitarem as alíquotas reduzidas e o recolhimento unificado de tributos. Mas a 10ª Câmara de Direito Público desconsiderou a prova obtida com a quebra do sigilo bancário do contribuinte. “Não há qualquer informação de que a agravada tivesse instaurado qualquer procedimento fiscal contra a agravante e, portanto, injustificada a quebra do sigilo”, diz na decisão o desembargador Paulo Galizia, relator do caso.
Em dezembro, a Churrascaria Irmãos Chieza, de São José do Rio Preto, conseguiu manter a liminar que lhe dava direito de permanecer no Simples. Na ocasião, a 6ª Câmara do TJ-SP aceitou o argumento do contribuinte de que havia sido excluído sem antes ter a chance de se defender. Com a decisão, está suspensa temporariamente a cobrança de R$ 320 mil em ICMS, referente aos anos de 2008 e 2009. Em primeira instância, depois de ter liminar negada, a empresa obteve recentemente sentença que confirmou a ilegalidade da quebra do sigilo bancário. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) espera ser notificada da decisão para entrar com recurso.
“O Fisco intima as operadoras de cartão e pura e simplesmente exclui os contribuintes “, afirma o especialista, que defende a churrascaria. Ele possui outro caso similar em seu escritório. Um outro restaurante do interior paulista obteve liminar na primeira instância para permanecer no regime e suspender uma autuação fiscal de R$ 230 mil. Segundo especialista, diversos estabelecimentos comerciais de São José do Rio Preto foram desenquadrados do regime. “Muitos não quiseram contestar a ilegalidade, e preferiram parcelar seus débitos.”
A Fazenda de São Paulo defende que não há ilegalidade em buscar diretamente os dados financeiros do contribuinte. A medida, segundo o Fisco, está prevista na Lei estadual nº 12.294, de 2006, e na Portaria CAT nº 87, do mesmo ano. Ainda segundo o órgão, a norma federal que determina a abertura de procedimento fiscal antes da quebra do sigilo não é aplicada para as administradores de cartão de crédito. Isso porque elas não seriam instituições financeiras.
Mas há também decisões desfavoráveis aos contribuintes. Em janeiro, a empresa Fornitura – O Mundo dos Relógios, de Campinas, teve o pedido para voltar ao Simples negado pela 7ª Câmara de Direito Público do TJ-SP. Por unanimidade, os desembargadores entenderam que não houve quebra de sigilo bancário. “É o cruzamento de dados entre as informações prestadas pelas administradoras de cartões e aqueles apresentados pelo contribuinte que permite saber qual a receita tributável”, diz o relator do caso, desembargador Luiz Sérgio Fernandes de Souza, acrescentando que o Código Tributário Nacional garante “amplos poderes” à administração pública para exigir informações dos bancos.
No caso da empresa Silvia Teresa Faidiga Martins, a decisão de primeira instância também foi favorável à Fazenda. Ao analisar pedido de liminar, a juíza Laís Helena Bresser Lang Amaral, da 2ª Vara da Fazenda Pública, entendeu que o direito ao sigilo poderia ser relativizado nos casos de interesse público, como nas apurações de sonegação fiscal. Além disso, segundo a juíza, as operações de cartão de crédito não estariam protegidas pelo sigilo bancário.
Outro especialista, que defende a empresa, contesta a decisão. “O direito de defesa deve ser respeitado. Caso contrário, qualquer mal entendido vai gerar exclusão do Simples”, afirma. A acusação de omissão de receita é referente ao período de janeiro de 2008 a dezembro de 2009.
Para especialistas, a tese dos contribuintes tem chance de prosperar nos tribunais superiores. Em 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o sigilo bancário só pode ser quebrado com ordem judicial. Os ministros entenderam que é inconstitucional permitir que a Receita Federal peça dados do contribuinte diretamente às instituições financeiras. “Se não há fiscalização aberta e determinação judicial, a quebra do sigilo é ilegal”, diz tributarista.
Segundo outro especilista, o Fisco viola garantias básicas. “O grande problema é avançar sobre um direito constitucionalmente garantido, que é o da privacidade”, afirma.
Liminar garante sigilo bancário de contribuinte
Um empresário de João Pessoa (PA) conseguiu na Justiça que a Receita Federal deixe de usar extratos bancários fornecidos pelo HSBC e Itaú Unibanco para fiscalizar sua declaração de Imposto de Renda (IR) de 2008.
Na liminar, o juiz João Bosco Medeiros de Sousa, da 1 ª Vara Federal da capital da Paraíba, proibiu também que o Fisco busque informações financeiras do contribuinte diretamente em outra instituição financeira. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) preferiu não comentar o caso, mas ainda poderá recorrer da decisão.
A pedido da Receita, o HSBC e o Itaú Unibanco haviam fornecido os extratos de aplicações financeiras, das movimentações de conta corrente e cópias de documentos de depósitos e pagamentos efetuados pelo empresário entre janeiro e dezembro de 2008. O objetivo era comparar as receitas financeiras com a declaração do IR do contribuinte, e verificar a existência de débitos fiscais. A requisição foi feita a partir do artigo 6º da Lei Complementar nº 105, de 2001, que permite à Receita o exame de dados bancários após a abertura da fiscalização.
Para o juiz que analisou o caso, as informações só poderiam ser repassadas com ordem do Poder Judiciário. Segundo o magistrado, a solicitação direta do Fisco, sem autorização judicial, viola o direito de sigilo de correspondência e conversas telefônicas, garantida pela Constituição Federal. “Com isso, a prova é ilegal e, como tal, não pode ser utilizada para as autuações fiscais contra o contribuinte”, diz.
A decisão da Justiça da Paraíba segue posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em 2010, decidiu que o sigilo bancário só pode ser quebrado com ordem judicial. Segundo outros especilistas, o julgamento por maioria apertada de votos – cinco de nove ministros foram favoráveis à tese do contribuinte – e o fato de a decisão não ter efeito vinculante fazem com que o precedente ainda seja pouco adotado nos tribunais. “A aplicação ainda é tímida no país, especialmente, na Justiça Federal”, afirma especialista. Este, cita que, no fim de 2011, a Justiça Federal da Paraíba negou um pedido de anulação de um débito fiscal com base na ilegalidade da prova. De acordo com Luiz Roberto Peroba, as últimas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já têm refletido o posicionamento do Supremo.
Em 2009, o STF reconheceu a repercussão geral do tema a partir do recurso de um contribuinte paulista. O processo ainda será julgado. Na ocasião, os ministros analisarão se os bancos devem fornecer informações financeiras diretamente ao Fisco, sem prévia autorização da Justiça. A decisão da Corte servirá de orientação para os demais tribunais do país.
Fonte: Valor Econômico via Fenacon em 04/04/2012