Vagner A. Alberto Advogados Associados

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06/02/2012

O fisco e a quebra de sigilo bancário

Aguarda-se com ansiedade a transformação em súmula vinculante da decisão proferida pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do RE nº 390.808-6/PR, quando ficou assentado que a quebra do sigilo bancário pelo Fisco somente poderá ocorrer por meio de autorização judicial. Enquanto isso, discute-se na doutrina pátria o sentido e o alcance do artigo 42 da Lei nº 9.430, de 1996.

Mencionado dispositivo estabelece a presunção de omissão de receitas no caso de evidenciada a existência de depósitos bancários não comprovados. Tal fundamento tem sido utilizado com frequência pelo Fisco federal para cobrar o Imposto de Renda das pessoas físicas e jurídicas que, em tese, não declararam os valores movimentados nas respectivas contas bancárias.

Nesta senda, boa parte da doutrina defende que a referida disposição infraconstitucional não pode, em qualquer hipótese, confrontar os comandos constitucionais, nem tampouco o regramento do artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN), que define o conceito de renda. Ademais, não pode ainda violar o dever de investigação e da prova inserido no conceito de lançamento (artigo 142 do CTN). A inversão do ônus da prova para o contribuinte é também uma flagrante violação do princípio constitucional do direito ao silêncio.

Não se pode exigir que o contribuinte produza prova contra si mesmo

Sustenta ainda a doutrina que o regramento do artigo 42 da Lei nº 9.430/96 não autoriza o lançamento do imposto no caso de existência de meros depósitos bancários, ainda que de origem não comprovada, sem a devida demonstração da existência de renda consumida pelo contribuinte.

Segundo as palavras do ilustre professor Helenilson Cunha Pontes, é absolutamente equivocado pretender retirar do artigo 42 da Lei nº 9.430/96 uma suposta presunção “juris tantum” em favor do Fisco, que o autorizasse a exigir imposto de renda sobre meros depósitos bancários, sem meros aprofundamentos investigatórios relativamente à presença de renda consumida ou à demonstração de outros elementos fáticos vinculados à movimentação da renda. Admitir o estabelecimento de tal presunção significaria inverter-se totalmente a pirâmide normativa em que se assenta a ordem jurídica, porquanto se estaria esvaziando completamente o sentido normativo dos artigos 42 e 142 do CTN, que obrigam a autoridade fiscal a demonstrar motivadamente a ocorrência do fato gerador.

Aliás, esse dispositivo do CTN consubstancia uma garantia individual contra o arbítrio das autoridades fiscais no procedimento de aplicação da lei tributária na medida em que define o lançamento como atividade vinculada. Portanto, o conceito de lançamento é um dever de prova, insuscetível de ser alterado pelo legislador ordinário. Obviamente que esse ônus de prova é apenas do Fisco e não do contribuinte.

Nesse corolário, mesmo antes da Lei nº 9.430 já havia sido consolidada a jurisprudência administrativa (vide o Acórdão CSRF/01-04.009, de 15/03/2005) no sentido de que a exigência do Imposto de Renda sobre simples depósitos bancários, sem demonstração da existência de renda consumida, conflita com o artigo 43 do CTN. Tal exigência fiscal somente será válida se acompanhada da demonstração de outros indícios que autorizem a presunção de aqueles depósitos representam, de fato e de direito, rendimentos omitidos.

Esta assertiva se baseia no simples fato daquela norma do caput do artigo 42 da Lei nº 9.430 tem o mesmo sentido normativo do regramento do artigo 6º da Lei nº 8.021, de 1990, revogado pela mesma Lei nº 9.430.

Na decisão assentada em maio do ano passado, no julgamento do Resp 1243401-RS, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a decisão do Tribunal de origem no sentido de que, no caso em exame, o Fisco não demonstrou que os recursos, apontados como omitidos, foram incorporados ao patrimônio do autor, ou mesmo que este tenha suprimido seu aporte, para fins de evadir-se da imputação fiscal.

Importante destacar as palavras da Juíza Federal Simone Barbisan Fontes, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, no relatório do acórdão “a quo” atacado quando afirmara que “essa prática não é suficiente para caracterizar a omissão de receitas nos limites apurados pelo Fisco, uma vez que não há comprovação de que obteve real acréscimo patrimonial decorrente dessas transações”.

Não faz qualquer sentido lógico se conceber que o comando do artigo 42 da Lei nº 9.430 instituiu uma presunção a favor do Fisco, a ponto de não se exigir o nexo causal entre a existência de depósitos bancários de origem não comprovada e a comprovação da renda consumida ou a incorporação ao patrimônio do contribuinte.

Ademais, como vimos, o ônus da prova é do Fisco, não podendo, em hipótese alguma, ser transferido para o contribuinte de forma a exigir por si esta comprovação. Em outras palavras, não se pode exigir que o contribuinte produza prova contra si mesmo.

Face aos argumentos acima aduzidos, quando a fiscalização não conseguir demonstrar, de forma clara e inequívoca, que os depósitos bancários não comprovados pelo contribuinte foram convertidos em renda consumida ou que foram incorporados ao patrimônio do contribuinte, poderá a respectiva cobrança ser discutida no âmbito administrativo ou judicial com razoável chance de êxito (Opinião de especialista).

 

OAB-SP pretende limitar duração de fiscalizações

A seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) deverá apresentar em breve outra proposta para garantir direitos básicos aos contribuintes do país. O texto, em fase final de elaboração, terá que ser analisado pelo Conselho Federal da entidade antes de ser encaminhado ao Congresso Nacional.

Uma das previsões é a de uniformizar o horário de atendimento nas repartições da Receita Federal para período integral nos dias úteis. Há também a proposta de fixar o tempo máximo de fiscalização que, segundo o texto, seria de 180 dias prorrogáveis por igual período. A cada prorrogação, o contribuinte teria cinco dias a mais para apresentar uma defesa. “O objetivo é garantir eficiência”, diz o autor do projeto e presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-SP, Antonio Carlos Rodrigues do Amaral. “O fiscal não deverá simplesmente abrir inúmeras fiscalizações ao mesmo tempo, mas focar nas que iniciar e terminá-las o quanto antes”, afirma.

Pelo texto, ficaria estabelecido o prazo de 180 dias também para o encerramento de cada uma das três fases do julgamento do processo administrativo. “Há casos em que a espera por uma resolução passa de oito anos”, diz Amaral.

Outras propostas visam simplificar o cumprimento de obrigações acessórias. Ficaria proibido ao Fisco, por exemplo, cobrar a mesma informação do contribuinte em duplicidade. A Receita teria ainda que consolidar em um mesmo dispositivo todas as normas referentes à obrigação, quando houvesse alteração ou edição de novas regras sobre o mesmo assunto. (BP)

 

Fonte: Valor Econômico